quarta-feira, 9 de maio de 2007

Realidade e Identidade

Havia vielas que sumiam, avenidas transparentes e uma rua intacta e longa. Via em parte...
Entrei na rua persistente, o tempo escuro, o dia escuro, as nuances escuras, ora noite e ora andava nela. Via em parte...
Era de ladrilhos, de asfalto, de areia, mar e formas, e eu massageava-lhe, buscando seu fim.
Transportado por ela ia. Cansado ia. Há anos ia. Encontrei-me logo em início, no asfalto e o concreto do início, com um homem-árvore. Suas raízes penetravam o concreto, buscando ali o desfecho da rua e eu lamentava porque os seus dedos não alcançariam o céu e seus frutozinhos insossos esquecidos esqueciam. Foi o que primeiro causou-me aversão à rua. Rasgando-me, relatei os homens sedentos pelo céu, de raízes concretas. Via em parte...
Alcancei a parte ladrilhada da rua, queria sentar e descansar, queria o fim, mas vi uma antena parabólica captando sinais por aí e enviando para uma casa que parabólica não sabia de significados. Pobre casa parabólica, pobre eu-hiperbólico.
Vi a areia na rua, vi-a de areia, as mulheres de areia vi, esculpidas por alguém que as deixou, pobres damas ligadas por composição à rua. Caminhavam em grãos, pensavam em grãos, cuspiam grãos, mulheres da rua grãos.
Tristeza do poeta! Rua de papel! Só, poeta da rua dormia nela, rolava nela, fazia-se nela. Pobre escritor! Pensava com a rua, pensante rua de papel, rasgava-a e enredava-a, era dela porque tinha que colá-la.
Pobre de mim! Se ao menos alguém me contasse onde desaguava a persistente. Via em parte...
Cansado parei-me, não havia-me visto em espelho ainda. Não encontrara nenhum e necessitaria de dois.
Chorei-me e resolvi descansar, encontrei entre as camadas persistentes, entre todo o mais, uma rocha e ali sentei, descansava, respirava e lamentava. A rocha, limpa que era, refletiu os meus pés e então pude vê-los. Quão bom é enxergar pequenas partes que sejam, pequenas partes têm aversão à cegueira.
Era peregrino naquela rua, não lhe pertencia e me entristeciam todos os homens-árvores, o concreto, a antena, a areia, são todos tristes, cujo trabalho é penetrar os espelhos despreparados. Que triste rua que não sabia o fim!
Sentei, quebrei-me e deixei ir-se para longe a rua de concreto... Não era dali... Vi a parte...